“(...) Ela tentava entender o que havia de diferente. Talvez
fossem as pessoas que mudaram as vestimentas, ou quem sabe o curso das estações
ou até mesmo alguma coisa no cheiro... Mas não conseguia perceber o quê. Era
como se ali não fosse seu lar, sua família, seus amigos, seu trabalho, sua
vida. Sentiu medo de estar enlouquecendo, não entendia se as coisas realmente
mudaram, ou se foi ela, ou ambos.
Certo dia, alguém lhe perguntou se havia algo errado, pois
estava distante... Ela apenas respondeu – Eu não sei. E não sabia, achava que
era o mal de ser humana, pensar, pensar e se perceber como parte de um sem
sentido, e estava tão preocupada em pensar, em seguir o que lhe foi
determinado, que se esqueceu de sentir, de impulso, de vibração. Mas agora as coisas
estavam diferentes, pois estava sentido... Era isso o que a incomodava, era
isso que lhe fazia desvanecer, ela sentia e quando sentiu, não só ela, mas tudo
em volta mudou.
Naquele dia ela se preparava para sair, se olhava no espelho
enquanto passava um batom nos lábios e pensava em como tudo isso era ridículo e
se riu... Talvez ele se apaixonasse pela cor de seus lábios, pelas palavras
ensaiadas durante a noite anterior, mas será que se apaixonaria pela pessoa por
detrás daquele batom?
Talvez – pensava ela – toda essa estranheza seja causada por ele, mesmo que ele não saiba,
mesmo que não tenha feito nada além daquele sorriso que fez com que o mundo
apagasse, que fez com que eu parasse de pensar e começasse a sentir e então
tudo está diferente. De repente era vida, era movimento, havia calor, não
sabia se era bom ou ruim, e nem havia ele como realização, se não como sinal de
mudança, de reconhecimento...”
SANTOS, T.F.